segunda-feira, 22 de agosto de 2011

A Mediadora - Assombrado, Meg Cabot, Cap 3

Detenção.
É o que você pega na Academia da Missão Junipero Serra quando banca a otária e dá um soco no seu meio-irmão no pátio e par acaso um professor vê.
- Não entendo o que deu em você, Suze - disse a Sra. Elkins, que, além de dar aula de biologia para a nona e a décima séries, também era encarregada de ficar depois da aula com os delinqüentes juvenis como eu. - E logo no primeiro dia de aula. É assim que você quer começar o novo ano?
Mas a Sra. Elkins não entendia. E eu não podia exatamente lhe contar. Quero dizer, como ia contar que de repente tudo tinha ficado demais? Que a descoberta de que meu meio-irmão sabia de uma coisa que eu tinha lutado para esconder do resto da família durante meses (além de descobrir que um monstro dos meus sonhos estava atualmente percorrendo os corredores da minha escola disfarçado de gato elegante) tinha feito com que eu me derretesse como um batom Maybelline deixado ao sol?
Não podia contar. Apenas recebi o castigo em silêncio, olhando os minutos do relógio se arrastarem lentamente. Nem eu nem os outros prisioneiros seriamos libertados antes das quatro horas.
- Espero que você tenha aprendido uma lição, Suze. - disse a Sra. Elkins quando essa hora finalmente chegou. - Você não está sendo um bom exemplo para as crianças menores, está, brigando na escola desse jeito?
Eu? Eu não estava sendo um bom exemplo? E Brad? Era Brad que estava planejando ter sua Oktoberfest pessoal na nossa sala. E no entanto Brad me tinha na palma da mão. E sabia disso.
- É - tinha dito ele na hora do almoço, quando fiquei ali parada olhando-o numa perplexidade absoluta, incapaz de acreditar no que ouvi. - Você se acha tão esperta, não é, deixando o cara entrar no seu quarto toda noite, não é? E como é que ele entra? Por aquela sua janela em cima do telhado da varanda? Bem, acho que o segredinho acabou, não é? Então fique quieta com relação a minha festa, e eu fico quieto sobre esse tal de Jesse.
Fiquei tão pasma com a notícia de que Brad podia ouvir - de que tinha ouvido - Jesse, que durante vários minutos não pude formular uma frase coerente, tempo em que Brad trocou cumprimentos com vários membros de seu grupo que vieram dar um tapa na sua mão e dizer coisas como: "Cara! Festa na piscina. Eu já estou lá!"
Finalmente consegui destravar o maxilar e perguntei:
- Ah, é? Bom, e o Jake? Quero dizer, Jake não vai deixar você ficar com um punhado de seus amigos para farrear.
Brad só me olhou como se eu fosse doida.
- Está brincando? Quem você acha que vai dar a cerveja? Jake vai roubar um barril onde ele trabalha.
Estreitei os olhos para ele.
- Jake? Jake vai pegar cerveja para você? De jeito nenhum. Ele nunca... - Então a compreensão baixou. - Quanto você vai pagar a ele?
- Cem pratas. Exatamente metade do que falta para aquele Camaro que ele está querendo.
Havia pouca coisa que Jake não faria para pôr as mãos num Camaro que fosse seu, eu tinha plena consciência disso.
Sem saída, encarei-o mais um pouco.
- E David? - perguntei finalmente. - David vai contar.
- Não vai - disse Brad cheio de confiança. - Porque se contar eu chuto a bunda magra dele daqui até o Alasca. E é melhor você não tentar defendê-lo, senão sua mãe vai ganhar uma bela fatia de torta de Jesse.
Foi então que eu o acertei. Não pude evitar. Foi como se meu punho tivesse mente própria. Num minuto estava do meu lado, no outro afundando na barriga de Brad.
A luta acabou num segundo. Meio segundo. O Sr. Gillarte, o novo treinador de atletismo, nos separou antes que Brad tivesse chance de me dar um soco também.
- Para longe - ordenou ele me empurrando, enquanto se curvava para cuidar de Brad que ofegava freneticamente.
Então eu sai dali. Direto para o padre D., que estava parado no pátio, supervisionando a colocação dos fios de luzinhas em volta do tronco de uma palmeira.
- O que eu posso lhe dizer, Suzannah? - disse ele, parecendo exasperado quando terminei de explicar a situação. - Algumas pessoas são mais perceptivas do que outras.
- Ta, mas o Brad? - Eu tinha de manter a voz baixa porque havia alguns jardineiros por perto, todos ajudando a montar os enfeites da festa do padre Serra que ia acontecer no sábado, o dia seguinte à bacanal na piscina do Brad.
- Bem, Suzannah. Você não poderia esperar que Brad guardasse segredo para sempre. Sua família acabaria descobrindo.
Talvez. O que eu não podia avaliar era como Brad, logo ele, sabia sobre Jesse quando alguns dos membros mais inteligentes de minha família - como Andy, por exemplo, ou mamãe - não faziam a mínima idéia.
Por outro lado, Max, o cachorro da família, sempre soube do Jesse - nem chegava perto do meu quarto por causa dele. E num nível intelectual, Brad e Max tinham muito em comum... ainda que Max fosse um pouquinho mais inteligente, claro.
- Espero sinceramente - disse a Sra. Elkins, quando finalmente soltou a mim e meus colegas prisioneiros - não ver você aqui de novo este ano, Suze.
- Eu também, Sra. E. - respondi, pegando minhas coisas.
Depois dei no pé.
Lá fora era uma tarde clara e quente de setembro no norte da Califórnia, o que significava que o sol era ofuscante, o céu tão azul que doía, e à distância dava para ver a espuma branca do Pacífico se enrolando na praia de Carmel. Eu tinha perdido todas as caronas possíveis para casa (Adam, que ainda era ansioso para levar todo mundo a qualquer lugar com seu fusca verde esportivo, e, claro, Brad, que tinha herdado o Land Rover de Jake, que agora tinha um veIho Honda Civic, mas só até obter o carro de seus sonhos) e eram mais de três quilômetros de caminhada até a Pine Crest Road, 99. Quase tudo morro acima.
Eu tinha chegado ao portão da escola quando meu cavaleiro de armadura brilhante apareceu. Pelo menos foi o que imaginei que ele se achava. Mas não estava num palafrém branco.
Dirigia um conversível BMW prateado, com a capota convenientemente baixada. Era o que parecia. - Entre - disse ele, enquanto eu estava parada na frente da missão, esperando o sinal de trânsito rnudar para atravessar a estrada. - Entre. Eu Ihe dou uma carona.
- Não, obrigada - falei tranqüilamente. - Prefiro andar.
- Suze. - Paul parecia entediado. - Entre no carro.
Não. - Veja bem, eu tinha aprendido minha lição, pelo menos no quesito "entrar em carros de caras que tinham tentado me matar". E isso não iria acontecer de novo. Especialmente com Paul, que não somente havia tentado me matar uma vez, mas que tinha me apavorado tanto ao fazer isso que eu revivia continuamente o incidente nos sonhos. - Eu já disse. Vou andar.
Paul balançou a cabeça, rindo consigo mesmo. - Realmente você é uma figura - disse ele.
- Obrigada. - o sinal mudou, e eu comecei a atravessar o cruzamento. Eu conhecia bem o lugar. Não precisava de ajuda.
Mas foi exatamente o que obtive. Paul dirigiu o carro ao meu lado, na alucinante velocidade de três quilômetros por hora.
- Você vai me acompanhar até em casa? - perguntei enquanto começávamos a subir a ladeira que dava nome as Colinas de Carmel. Era uma coisa boa o fato de essa rua em particular não ter tráfego pesado às quatro da tarde, caso contrário Paul poderia simplesmente ter enlouquecido alguns dos meus vizinhos, engarrafando o único caminho para a civilização, dirigindo daquela maneira.
- Vou. Isto é, a não ser que você pare de bancar a teimosa e entre no carro.
- Não, obrigada - falei de novo.
Continuei andando. Fazia calor. Eu estava começando a me sentir meio úmida com o suéter. Mas de jeito nenhum ia entrar no carro daquele cara. Fui andando pela calçada, com cuidado para evitar qualquer planta que se parecesse com meu inimigo mais mortal (pelo menos antes de Paul ter aparecido), o sumagre-venenoso, e xinguei em silêncio a Teoria crítica desde Platão, que parecia estar ficando mais pesada nos meus braços a cada passo.
- Você está errada em não confiar em mim - observou Paul enquanto ia subindo o morro ao meu lado em seu serpentomóvel prateado. - Nós dois somos iguais, você sabe.
- Sinceramente espero que não seja verdade - falei. Contra alguns inimigos a educação podia ser uma dissuasão tão forte quanto um punho. Não estou brincando. Experimente um dia desses.
- Desculpe desapontá-la - disse Paul. - Mas é. O que o padre Dominic lhe disse? Para não ficar sozinha comigo? Para não acreditar numa palavra do que eu digo?
- De jeito nenhum - falei no mesmo tom distante. - O padre Dominic acha que eu deveria lhe dar o benefício da dúvida.
Por trás de seu volante forrado de couro, Paul pareceu surpreso.
- Verdade? Ele disse isso?
- Ah, disse - falei, notando um lindo amontoado de botões-de-ouro crescendo na borda da rua e desviando-me cuidadosamente para o caso de eles estarem escondendo algum ramo perigoso de sumagre-venenoso. - O padre Dominic acha que você esta aqui porque quer se ligar com os únicos outros mediadores que conhece. Ele acha que nosso dever como seres humanos caridosos é deixar que você se emende e ajudá-lo pelo caminho do que é certo.
- Mas você não concorda com ele? - Paul estava me olhando atentamente. Bem, e por que não olharia? Considerando como estava indo devagar, não precisaria ficar de olho na rua nem nada.
- Olha - falei, desejando ter uma faixa ou alguma coisa para prender o cabelo. Ele estava começando a grudar na nuca. O prendedor de cabelo, de tartaruga, que eu tinha posto de manhã, tinha desaparecido misteriosamente. - o padre Dominic é a melhor pessoa que eu já conheci. Só vive para ajudar os outros. Ele acredita genuinamente que os seres humanos são bons por natureza e que, se forem tratados assim, vão reagir de acordo.
- Mas, pelo que estou vendo, você não concorda, não é?
- Eu acho que nós dois sabemos que o padre Dom está vivendo num mundo de sonho. - Olhei direto em frente enquanto subia o morro, esperando que Paul não adivinhasse que o coração batendo forte não tinha nada a ver com o exercício, e tudo com sua presença. - Mas porque não quero frustrar o cara, vou manter comigo mesma minha opinião pessoal, de que você é um psicopata manipulador.
- Psicopata? - Paul pareceu deliciado ao ser descrito desse modo... mais uma prova de que ele era exatamente o que eu achava. - Gosto da palavra. Eu já fui chamado de um monte de coisas, mas nunca de psicopata.
- Não foi um elogio - esclareci, já que ele parecia estar entendendo assim.
- Eu sei. É isso que torna a coisa tão divertida. Você é uma garota incrível, sabe!
- Tá, tá - falei irritada. Eu nem conseguia insultar o sujeito. - Só diga uma coisa.
- O quê?
- Naquela noite em que nós nos encontramos... - apontei para o céu -... você sabe, lá em cima.
Ele assentiu.
- Sei. O quê é que tem?
- Como você chegou lá? Quero dizer, ninguém exorcizou você, certo?
Paul sorriu. Para minha perplexidade vi que eu tinha feito a pergunta que ele mais queria ouvir.
- Não, ninguém me exorcizou. E você não precisava de que ninguém a exorcizasse também.
Isso quase me derrubou. Parei de repente.
- Você está dizendo que eu simplesmente posso sair andando lá por cima sempre que quiser? - perguntei, realmente pasma.
- Há muita coisa que você pode fazer e ainda não sabe, Suze - disse Paul, ainda rindo preguiçosamente. - Coisas com as quais você nunca sonhou. Coisas que eu posso mostrar.
O tom sedoso de sua voz não me enganou. Paul era charmoso, era verdade, mas também era mortal.
- É - falei, rezando para que ele não pudesse ver como meu coração estava batendo rápido através de toda aquela seda cor-de-rosa. - Tenho certeza de que sim.
- Sério, Suze. O padre Dominic é um cara fantástico. Não estou negando. Mas não passa de um mediador. Você é um pouquinho mais do que isso.
- Sei. - Encolhi os ombros e comecei a andar de novo.
Tínhamos chegado finalmente ao topo do morro, e eu entrei na sombra de alguns pinheiros gigantes dos lados da rua. Meu alívio por finalmente estar fora do calor era palpável. Só queria me livrar de Paul com a mesma facilidade.
- Então durante toda a minha vida as pessoas disseram que eu sou uma coisa, e de repente você aparece e diz que eu sou outra, e eu deveria simplesmente acreditar?
- Sim.
- Porque você é tão digno de confiança! - zombei, parecendo um pouquinho mais segura do que me sentia.
- Porque eu sou tudo que você tem - corrigiu ele.
- Bom, isso não é grande coisa, é? - Olhei-o irritada. - Ou será que preciso observar que, na última vez em que vi você, você me deixou perdida no inferno?
- Não era o inferno - disse Paul, com outra de suas viradas características de olhos. - E você acabou achando a saída.
- E o Jesse? - Meu coração estava batendo mais forte do que nunca, porque isso, claro, era o que realmente importava. Não o que ele tinha feito ou tentado fazer comigo, mas o que tinha feito com Jesse... o que eu morria de medo de que ele tentasse fazer de novo.
- Eu pedi desculpas por aquilo. - Paul pareceu irritado. - Além do mais, tudo acabou bem, não foi? E como eu disse, Suze, você é muito mais poderosa do que imagina. Só precisa de alguém para mostrar seu verdadeiro potencial. Você precisa de um mentor - um mentor de verdade, e não de um padre de sessenta anos que considera o padre Junipero Não-sei-das-quantas o princípio e o fim do universo.
- Certo. E imagino que você se acha o sujeito certo para bancar o Sr. Miyagi para o meu Karatê Kid.
- Algo do tipo.
Estávamos virando a esquina para o numero 99 da Pine Crest Road, empoleirado num morro que dava para o vale de Carmel. Meu quarto, na frente da casa, tinha vista para o oceano. À noite a névoa soprava do mar, e quase dava para vê-la caindo em fiapos sobre o peitoril se eu deixasse a janela aberta. Era uma bela casa, uma das mais antigas de Carmel, que já tinha sido uma pensão por volta de 1850. Nem tinha reputação de ser assombrada.
- O que diz, Suze? - Paul estava com um dos braços pendurado casualmente no encosto do banco do carona, ao lado. - Jantar esta noite? Eu pago. Vou lhe contar coisas sobre você, sobre o que você é, que ninguém mais neste planeta sabe.
- Obrigada - falei, entrando no meu quintal coberto de agulhas de pinheiro, sentindo-me insanamente aliviada. Bem, e por que não? Eu tinha sobrevivido a um encontro com Paul Slater sem ser jogada em outro plano de existência. Era uma tremenda realização. - Mas não, obrigada. Vejo você na escola amanhã.
Então fui andando pelo grosso tapete de agulhas de pinheiro até a entrada de veículos, enquanto atrás de mim ouvia Paul gritando:
- Suze! Suze, espera!
Só que não esperei. Fui direto pela entrada de veículos até a varanda da frente, subi a escada, abri a porta e entrei.
Não olhei para trás. Não olhei para trás nem uma vez. - Estou em casa - gritei, para o caso de ter alguém em baixo que ligasse a mínima para isso. Tinha. Peguei-me sendo interrogada par meu padrasto, que estava preparando o jantar e parecia ansioso em saber tudo sobre o "meu dia". Depois de contar e obter nutrição na forma de uma maçã e um refrigerante diet, subi a escada para o segundo andar e abri a porta do meu quarto.
Havia um fantasma sentado no parapeito da janela. Ele ergueu os olhos quando entrei.
- Olá - disse Jesse.

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