segunda-feira, 22 de agosto de 2011

A Mediadora - Assombrado, Meg Cabot, Cap 17

Eu não estava sozinha. Paul estava comigo. E Craig Jankow também.
- Que diab... ? - Craig olhou para um lado e outro do corredor comprido e num silêncio fantasmagórico que contrastava com o barulho da festa de Brad. - Onde é que nós estamos?
- Onde você deveria estar há muito tempo - disse Paul, cuidadosamente espanando fiapos de sua camisa (se bem que, como este era um plano alternativo e só sua consciência, mas não seu corpo, estava ali, não havia fiapos para espanar). Para mim, Paul disse com um sorriso: - Bom trabalho, Suze. E olha que foi sua primeira tentativa.
- Cala a boca. - Eu não estava no clima para amenidades.
Estava num lugar onde realmente, realmente não queria estar... um lugar que, toda vez em que voltava a ele nos meus pesadelos, me deixava completamente esgotada física e emocionalmente. Um lugar que sugava minha vida... para não mencionar minha coragem. - Não estou exatamente feliz com isso.
- Dá para ver. – Paul levantou a mão e tateou o nariz.
Como estávamos no mundo dos espíritos, e não no real, ele não sangrava mais. Suas roupas também não estavam molhadas. - Você sabe que o fato de estarmos aqui em cima significa que nossos corpos, lá embaixo, estão inconscientes.
- Sei - respondi olhando nervosamente para um lado e outro do corredor cheio de névoa. Como nos sonhos, eu não podia ver o que havia em cada extremidade. Era só uma fileira de portas que pareciam continuar para sempre.
- Bem - disse Paul -, Isso deve atrair a atenção de Jesse, de qualquer modo. Você subitamente entrando em coma, quero dizer.
- Cala essa boca - falei de novo. Sentia vontade de chorar. Realmente. E odeio chorar. Quase mais do que odeio cair em poços sem fundo. - Isso tudo é sua culpa. Você não devia ter provocado o Jesse.
- E você - disse Paul com uma fagulha de raiva - não deveria andar por aí beijando...
- Com licença - interrompeu Craig. - Mas alguém poderia me dizer exatamente o que...
- Cala a boca - dissemos Paul e eu, exatamente ao mesmo tempo
Então, para Paul, eu falei com a voz embargada:
- Olha, eu lamento o que aconteceu na sua casa. Certo? Eu perdi a cabeça. Mas isso não significa que alguma coisa esteja acontecendo entre nós.
- Você perdeu a cabeça - respondeu Paul, inexpressivo.
- Isso mesmo. - Os pêlos da minha nuca estavam ficando de pé. Eu não gostava desse lugar. Não gostava da névoa branca que lambia minhas pernas. Não gostava do silêncio sepulcral. E não gostava especialmente de não poder ver mais do que poucos metros adiante. Quem sabia onde o chão iria sumir debaixo dos pés?
- E se eu quiser que haja alguma coisa entre nós? - perguntou ele.
-Azar.
Ele olhou para Craig, que estava começando a andar pelo corredor, olhando com interesse as portas fechadas de cada lado.
- E quanto ao deslocamento? - perguntou Paul.
- O que é que tem?
- Eu disse a você como fazer, não disse? Bem, há outras coisas que eu posso lhe mostrar. Coisas que você nunca sonhou que poderia fazer.
Parei. Pensei no que ele tinha dito naquela tarde em seu quarto, sobre transferência de alma. Havia uma parte de mim que queria saber do que se tratava. Havia uma parte de mim que queria tremendamente saber sobre isso.
Mas também havia uma grande parte que não queria ter nada a ver com Paul Slater.
- Qual é, Suze. Você sabe que esta doida para saber. Toda a sua vida você esteve pensando em quem, ou no que, você é realmente. E eu estou dizendo que tenho as respostas. Eu sei. E vou ensinar, se você permitir.
Encarei-o, furiosa.
- E o que você ganha com essa oferta magnânima?
- O prazer de sua companhia - disse ele com um sorriso.
Falou isso casualmente, mas eu soube que não havia nada de casual naquilo. Motivo pelo qual, apesar de estar doida para descobrir mais sobre todas as coisas que ele dizia saber, fiquei relutante em aceitar a oferta. Parque havia um ardil. E o ardil era que eu teria de passar tempo com Paul Slater.
Mas talvez valesse a pena. Quase. E não porque eu finalmente poderia ter alguma idéia da verdadeira natureza de nosso suposto dom, mas porque finalmente eu poderia ser capaz de garantir a segurança de Jesse... pelo menos com relação a Paul.
- Certo - falei.
Dizer que Paul ficou surpreso seria 0 eufemismo do ano.
Mas antes que ele pudesse dizer alguma coisa, acrescentei, carrancuda:
- Mas Jesse está fora dos limites para você. Chega de insultos. Chega de brigas. E chega de exorcismos.
Uma das escuras sobrancelhas de Paul se levantou. - Então é assim que é - disse ele lentamente.
- É. É assim que é.
Paul não falou nada por um tempo tão longo que eu achei que ele queria esquecer a coisa toda. O que, para mim, estaria ótimo. Mais ou menos. A não ser pela parte do Jesse.
Mas então Paul deu de ombros e disse: - Por mim, tudo bem.
Encarei-o, mal ousando acreditar nos meus ouvidos. Será que eu tinha engendrado - com grande sacrifício pessoal, admito - a liberação de Jesse?
Foi o jeito casual de Paul com relação a coisa toda que me convenceu de que sim. Especialmente sua reação a Craig, quando este estendeu a mão, sacudiu uma das maçanetas e gritou:
- Ei, o que tem atrás dessas portas?
- Sua recompensa merecida - disse Paul com um risinho. Craig olhou, por cima do ombro, para Paul.
- Verdade? Minha recompensa merecida?
- Claro - disse Paul.
- Não ouça o que ele diz, Craig - falei. - Ele não sabe o que tem atrás das portas. Pode ser sua recompensa. Ou pode ser sua próxima vida. Ninguém sabe. Ninguém voltou par uma delas. Só se pode entrar.
Craig olhou especulativamente para a porta a sua frente.
- Próxima vida, hein?
- Ou salvação eterna - disse Paul. - Ou, dependendo do quanto você foi ruim, a danação eterna. Vá. Abra e descubra se você foi perverso ou gente fina.
Craig deu de ombros mas não afastou o olhar da porta a sua frente.
- Bem - disse ele. - Deve ser melhor do que ficar por aqui. Diga a Neil que eu lamento ter agido como um... você sabe. É só que, bem, é só que não foi muito justo.
Então ele encostou a mão na maçaneta e girou-a. A porta se abriu uma fração de centímetro...
E Craig desapareceu num clarão de luz tão ofuscante que eu tive de levantar as mãos para proteger os olhos.
- Bem - ouvi Paul dizendo alguns segundos depois. - Agora que ele está fora do caminho...
Baixei os braços. Craig tinha ido embora. Não restava nada onde ele estivera parado. Até a névoa parecia inalterada.
- Agora podemos sair daqui? - Paul deu um pequeno tremor. - Esse lugar me dá arrepios.
Tentei esconder minha perplexidade ao ver que Paul sentia exatamente o mesmo que eu em relação ao plano espiritual. Imaginei se ele também tivera pesadelos com aquilo. De algum modo, não parecia.
Mas achei que eu também não teria mais.
- Certo - falei. - Só que... como é que a gente volta?
- Do mesmo modo - disse Paul, fechando os olhos. – Só visualize.
Fechei os olhos, sentindo o calor dos dedos de Paul no meu braço e a lambida fria da névoa nas minhas pernas...
Um segundo depois o silêncio medonho tinha sumido, substituído pela música alta. E gritos. E sirenes.
Abri os olhos.
A primeira coisa que vi foi o rosto de Jesse, acima do meu. Estava pálido as luzes piscantes, vermelhas e azuis, da ambulância que tinha parado junto ao deque. Ao lado do rosto de Jesse estava o de Cee Cee, e ao lado do dela, o de Jake.
Cee Cee foi a primeira a falar:
- Ela acordou! Ah, meu Deus, Suze! Você acordou! Você está bem?
Sentei-me, grogue. Não me sentia muito bem. De fato, era como se alguém tivesse me dado uma cacetada. Dor de cabeça. Dor de cabeça latejante. Dor de cabeça capaz de provocar náuseas.
- Suzannah - O braço de Jesse estava em volta de mim.
Sua voz, no meu ouvido, era ansiosa. - Suzannah, o que aconteceu? Você esta bem? Aonde... aonde você foi? Onde está Craig?
- No lugar ao qual pertence - falei, encolhendo-me enquanto luzes vermelhas e brancas faziam minha dor de cabeça piorar mil vezes. - Neil... Neil está bem?
- Está ótimo, Suzannah. -Jesse parecia tão trêmulo quanto eu: bastante trêmulo. Eu não imaginava que os últimos cinco minutos tivessem sido tão fantásticos para ele. Quero dizer, comigo caída, inconsciente, e sem motivo aparente. Meus jeans estavam molhados de onde eu tinha caído na água da piscina. Só podia imaginar como meu cabelo estaria. Tive medo de passar por um espelho.
- Suzannah. – O modo de Jesse me segurar era possessivo. Deliciosamente possessivo. - O que aconteceu?
- Quem é Neil? - quis saber Cee Cee. Ela olhou preocupada para Adam. - Ah, meu Deus. Ela está delirando.
- Eu conto mais tarde - falei olhando Cee Cee. A alguns metros de distência pude ver que Paul também estava se sentando. Diferentemente de Neil, sentado onde antigamente ficava a porta de vidro, ia se virando sem a ajuda de um paramédico. Mas, como Neil, Paul tossia um monte de água com cloro. E não somente seus jeans estavam molhados. Ele estava encharcado da cabeça aos pés. E o nariz sangrava profusamente.
- O que temos aqui? - Uma paramédica se ajoelhou perto de mim. Levantando meu pulso, começou a medir os batimentos.
- Ela apagou - disse Cee Cee oficiosamente. - E não, ela não bebeu nada.
- Há muita coisa acontecendo aqui - disse a paramédica. Ela verificou minhas pupilas. - Você bateu a cabeça também?
- Talvez tenha batido quando desmaiou - disse Cee Cee.
A paramédica olhou, desaprovando.
- Quando é que vocês vão aprender? O álcool não combina com piscinas.
Não me incomodei em argumentar que eu não estivera bebendo. Nem, por sinal, sentada na piscina. Afinal de contas estava totalmente vestida. Bastou que a paramédica me deixasse ir depois de dizer que meus sinais vitais estavam ótimos e que eu deveria beber muita água e ir dormir. Neil também recebeu carta branca. Eu o vi pouco depois, chamando um táxi pelo celular. Subi e disse a ele que agora era seguro usar seu carro. Ele só me olhou como se eu fosse maluca.
Paul não teve tanta sorte quanto Neil e eu. Seu nariz estava quebrado, por isso o levaram para a emergência. Eu o vi instantes depois de o empurrarem numa maca, e ele não parecia feliz. Deu uma olhada para mim pela lateral da tala que tinham grudado no seu rosto.
- Dor de cabeça? - perguntou numa voz nasalada.
- De matar.
- Esqueci de avisar a você. Sempre acontece, depois de um deslocamento.
Paul fez uma careta. Eu percebi que ele estava tentando sorrir.
- Eu voltarei - falou numa imitação lamentável do Exterminador do Futuro. Então os paramédicos vieram para empurrar sua maca.
Depois de Paul ter ido embora, olhei em volta procurando Jesse. Não fazia idéia do que diria a ele... talvez alguma coisa do tipo: você não vai ter de se preocupar mais com Paul.
Só que isso terminou não importando, porque eu não o vi em lugar nenhum. Em vez disso só vi Brad, ofegando muito, e vindo na minha direção.
- Suze - gritou ele. - Venha. Algum idiota chamou os canas. Vamos ter de esconder o barril antes que eles cheguem.
Eu só olhei para ele.
- De jeito nenhum – falei.
- Suze. - Brad estava em pânico. - Qual é! Eles vão confiscar o barril! Ou pior, vão prender todo mundo.
Olhei em volta e vi Cee Cee parada perto do carro de Adam. Gritei: - Ei, Cee Cee. Posso passar a noite na sua casa?
Cee Cee gritou de volta: - Claro. Se você me contar tudo que há para saber sobre o tal de Jesse.
- Não há o que contar – falei. Porque realmente não havia. Jesse tinha ido embora. E eu tinha uma boa idéia de para onde.
E não havia nada que pudesse fazer a respeito.

Nenhum comentário:

Postar um comentário