segunda-feira, 22 de agosto de 2011

A Mediadora - Assombrado, Meg Cabot - Cap 12

De modo que, basicamente, eu era uma mulher morta.
Especialmente quando David, que, claro, não sabia que Jesse estava ali parado (ou que por acaso ele é o homem por quem sinto uma paixão que consome tudo... pelo menos quando Paul Slater não estava me beijando), disse:
- Isso é daquele tal de Paul? Foi o que pensei. Ele ficou me fazendo um monte de perguntas sobre por que você não foi a escola hoje.
Eu nem pude olhar na direção de Jesse, de tão mortificada que me sentia.
- Hm - falei. - É.
- O que ele quer que você desculpe? - quis saber David. - O negócio de ser vice-presidente?
- Hm. Não sei.
- Porque, sabe, a sua campanha está realmente com problemas. Sem ofensa, mas Kelly está distribuindo chocolate. É melhor você bolar alguma coisa boa bem depressa, caso contrário vai perder a eleição.
- Obrigada, David. Tchau, David.
David me olhou estranhamente por um momento, como se não tivesse certeza de por que eu o estava dispensando de modo tão abrupto. Depois olhou o quarto em volta, como se percebesse pela primeira vez que talvez não estivéssemos sozinhos, ficou vermelho como uma beterraba e disse:
- Certo, tchau. - E saiu do meu quarto como um raio. Juntando toda a coragem, virei a cabeça para Jesse e falei: - Olha, não é o que você...
Mas minha voz ficou no ar, porque ao meu lado Jesse estava com aparência assassina. Quero dizer, de verdade, como se quisesse matar alguém.
Só que não dava para ver quem ele que ria matar, porque acho que naquele ponto eu era uma candidata tão boa para o assassinato quanto Paul.
- Suzannah - disse Jesse numa voz que eu nunca o tinha ouvido usar antes. - O que é isto?
A verdade é que Jesse não tinha o direito de estar furioso. Nenhum direito. Quero dizer, ele tinha tido sua chance, não é? Tinha tido, e tinha estragado. Ele estava com sorte por eu não ser o tipo de garota que desiste fácil.
- Jesse. Olha. Eu ia contar. Só esqueci...
- Contar o que? - A pequena cicatriz no lado direito da testa de Jesse (que, como fiquei sabendo, não era resultado de uma luta com um bandido, como sempre tinha presumido romanticamente, e sim, imagine só, da mordida de um cachorro) estava muito branca, sinal claro de que Jesse sentia muita, muita raiva. Como se eu não pudesse ver pelo tom de sua voz. - Paul Slater voltou a Carmel, e você não me contou?
- Ele não vai tentar exorcizar você de novo, Jesse - falei apressadamente. - Ele sabe que nunca iria se dar bem, não enquanto eu estiver par perto...
- Isso não me importa - disse Jesse cheio de desprezo... Foi você que ele deixou para morrer, lembra? E essa pessoa freqüenta a sua escola agora? O que o padre Dominic tem a dizer sobre isso?
Respirei fundo.
- O padre Dominic acha que nós devemos lhe dar outra chance. Ele...
Mas Jesse não me deixou terminar. Tinha se levantado da cama e andava pelo quarto murmurando baixinho em espanhol. Eu não tinha idéia do que ele estava dizendo, mas não parecia agradável.
- Olha, Jesse. Foi exatamente par isso que eu não contei a você. Sabia que você ia perder a cabeça assim...
- Perder a cabeça? - Jesse me deu um olhar incrédulo - Suzannah, ele tentou matar você!
Balancei a cabeça. Era preciso muita coragem, mas balancei mesmo assim.
- Ele diz que não tentou, Jesse. Diz... Paul diz que eu teria achado o caminho para fora de lá sozinha. Disse uma coisa sobre a existência de um pessoal chamado de deslocadores e que eu sou uma deslocadora. Diz que eles são diferentes dos mediadores, que em vez de apenas poder... você sabe, ver e falar com os mortos, os deslocadores podem se mover livre mente pelo reino dos mortos, também...
Mas em vez de ficar impressionado com essa novidade, Jesse apenas ficou mais furioso.
- Parece que você e ele andaram conversando um bocado ultimamente.
Se eu não soubesse, poderia achar que Jesse quase parecia... bem, com ciúme. Mas como sabia muito bem (como ele tinha deixado bem claro) que não sentia por mim o mesmo que eu sentia por ele, simplesmente dei de ombros.
- O que eu devo fazer, Jesse? Quero dizer, agora ele freqüenta a minha escola. Não posso simplesmente ignorá-lo. - Claro que eu também não precisava ir a casa dele e lhe dar um beijo de língua. Mas essa era uma coisa que eu iria esconder de Jesse a todo custo. - Além disso ele parece saber um monte de coisas. Coisas sobre mediadores. Coisas que o padre Dominic não sabe, talvez nem tenha sonhado...
- Ah, e tenho certeza de que Slater está todo feliz em contar tudo que sabe a você - disse Jesse com muito sarcasmo.
- Bem, claro que está, Jesse. Quero dizer, afinal de contas nós dois temos esse dom meio incomum...
- E Paul Slater sempre foi ansioso por compartilhar informações sobre esse dom com outros mediadores que ele conhece.
Engoli em seco. Aí Jesse me pegou. Por que Paul estava ansioso para ser meu mentor? A julgar pelo modo como tinha dado em cima de mim em seu quarto, eu tinha uma idéia muito boa. Mesmo assim era difícil acreditar que suas motivações fossem totalmente lascivas. Havia garotas muito mais bonitas do que eu freqüentando a Academia da Missão, garotas que ele poderia ter com muito menos problemas.
Mas nenhuma delas, claro, compartilhava nosso dom especial.
- Olha - falei. - Você está reagindo com exagero. Paul é um escroto, verdade, e eu não confiaria nem um pouco nele. Mas realmente não acho que ele esteja querendo me pegar. Ou você.
Jesse riu, mas não como se achasse alguma coisa engraçada na situação.
- Ah, não acho que seja a mim que ele quer pegar, mi hermosa. Não é para mim que ele esta mandando rosas.
Olhei as rosas.
- Bem - falei sentindo-me ruborizar. - É. Entendo o que você quer dizer. Mas acho que ele só mandou essas rosas porque se sente muito mal com o que fez. - Não mencionei a transgressão mais recente de Paul contra mim. Deixei Jesse achar que eu estava falando do que Paul tinha feito no verão. - Quero dizer, ele não tem ninguém - continuei. Não tem mesmo. - Pensei na grande casa de vidro em que Paul morava, na mobília esparsa e desconfortável. - Eu acho... Jesse, honestamente acho que parte do problema de Paul é que ele é realmente, realmente solitário. E não sabe o que fazer a respeito, porque ninguém nunca ensinou, você sabe, como agir como um ser humano decente.
Mas Jesse não queria aceitar nada disso. Eu podia sentir quanta pena quisesse de Paul - e parte de mim realmente sentia, e nem estou falando da parte que considerava Paul um beijador fantástico - mas para Jesse o sujeito era e sempre seria um canalha.
- Bem, para alguém que não sabe agir como um ser humano decente - disse ele, indo até as rosas e arrancando um dos botões gordos e escarlates - ele certamente esta fazendo uma boa imitação de como um deles deve agir. Um que, por acaso, esteja apaixonado.
Senti-me ficando vermelha como as rosas ao lado das quais Jesse estava imóvel.
- Paul não esta apaixonado por mim – falei. - Acredite. - Porque caras apaixonados não mandam capangas tentar impedir as garotas de fugir de sua casa. Mandam? - E mesmo que estivesse, agora certamente não está...
- Ah, verdade. - Jesse balançou a cabeça na direção do cartão que eu estava segurando. - Acho que o modo como ele usou a palavra amor, e não atenciosamente, cordialmente ou com meus respeitos, dá a entender o contrário, não é? E o que você quer dizer com: se estava, não está mais? - Seus olhos escuros ficaram ainda mais intensos. - Suzannah, aconteceu... alguma coisa entre vocês dois? Alguma coisa que você não está me contando?
Droga! Olhei para o colo, deixando parte do cabelo esconder meu rosto, de modo que ele não visse o quanto eu estava ruborizando.
- Não - falei para o lençol. - Claro que não.
- Suzannah...
Quando levantei os olhos de novo, ele não estava mais parado perto das rosas. Em vez disso estava perto da minha cama. Tinha levantado uma das minhas mãos e estava me olhando com aquele seu olhar escuro, impenetrável.
- Suzannah - disse ele de novo. Agora sua voz não era mais assassina. Em vez disso era gentil, gentil como seu toque. - Escute. Eu não estou com raiva. Não de você. Se houver alguma coisa... qualquer coisa... que você queira contar, você pode.
Balancei a cabeça com força suficiente para fazer o cabelo chicotear minhas bochechas.
- Não. Eu já disse. Não aconteceu nada. Nada mesmo. Mas mesmo assim Jesse não soltou minha mão. Em vez disso acariciou-a com um polegar calejado.
Prendi o fôlego. Era isso?, me perguntei. Era possível que depois de todas essas semanas me evitando, Jesse ia finalmente - finalmente - confessar seus verdadeiros sentimentos par mim?
Mas, pensei com o coração martelando doidamente, e se não fossem os sentimentos que eu esperava? E se afinal de contas ele não me amasse? E se aquele beijo tivesse sido apenas ... sei lá. Uma experiência ou alguma coisa assim? Um teste no qual eu não tinha passado? E se Jesse tivesse decidido que só queria ser meu amigo?
Eu morreria, só isso. Ia me deitar e morrer.
Não, falei comigo mesma. Ninguém segurava a mão de alguém como Jesse estava segurando a minha e dizia que não a amava. De jeito nenhum. Não era possível. Jesse me amava. Tinha de me amar. Só uma coisa - ou alguém - o estava impedindo de admitir...
Tentei encorajá-lo a fazer a confissão que eu tanto queria ouvir.
- Sabe, Jesse - falei, não ousando encará-lo, mas mantendo o olhar nos dedos que seguravam os meus. - Se há alguma coisa que você queira me contar, você pode. Quero dizer, sinta-se a vontade.
Juro que ele ia dizer alguma coisa. Juro. Finalmente consegui levantar os olhos para os dele, e juro que quando nossos olhos se cruzaram alguma coisa passou entre nós. Não sei o que, mas alguma coisa. Os lábios de Jesse se separaram, e ele estava para dizer sei lá o que, quando a porta do meu quarto se abriu subitamente. Cee Cee, seguida por Adam, entrou, parecendo furiosa e carregando um monte de papelões.
- Certo, garota - rosnou Cee Cee. - Chega de embromar. Precisamos cuidar dos negócios, e precisamos cuidar dos negócios agora. Kelly e Paul estão chutando a bunda da gente. Temos de bolar um slogan de campanha, e temos de bolar agora. Temos um dia até a eleição.
Olhei incrédula para Cee Cee, Jesse tão pasmo quanto eu. Ele tinha largado minha mão como se ela pegasse fogo. - Bem, oi, Cee Cee - falei. - Oi, Adam. Legal vocês dois virem aqui. Já ouviram falar em bater na porta?
- Ah, por favor - disse Cee Cee. – Por quê? Porque a gente poderia interromper você e seu precioso Jesse?
Ao ouvir isso Jesse levantou as sobrancelhas. Muito. Ruborizando-me furiosamente - puxa, eu não queria que ele soubesse que eu andei falando dele com meus amigos - falei: - Cale a boca, Cee Cee.
Mas Cee Cee, que tinha largado os papelões e agora estava espalhando pincéis atômicos por toda parte, falou:
- A gente sabia que ele não estava aqui. Não tem nenhum carro lá embaixo. Além disso, o Brad disse para a gente subir.
Claro que disse.
Olhando as rosas, Adam assobiou.
- São dele? Quero dizer, do Jesse? O cara tem classe, quem quer que ele seja.
Não tenho idéia de como Jesse reagiu ao ouvir isso, já que não ousei olhar na sua direção.
- São - falei, só para não ter de dar explicações complicadas. - Escute, pessoal, esse não é realmente um bom...
- Eca! - Cee Cee, abaixada perto de um pedaço de papelão, finalmente estava em condições de dar uma boa olhada nos meus pés pela primeira vez. - Isso é nojento! Seus pés parecem o daquelas pessoas que tiraram do Everest...
- Aquilo foi congelamento - disse Adam, curvando-se para examinar as solas dos meus pés. - Os deles estavam pretos. Acho que Suze tem o problema oposto. Isso são bolhas de queimadura.
- É, são - concordei. - E doem mesmo. Então, se não se incomodam...
- Ah, não - disse Cee Cee. - Você não vai se livrar de nos tão facilmente, garota. Temos de conseguir um slogan de campanha. Se eu vou abusar dos meus privilégios de usar a copiadora com meu cargo de editora do jornal da escola para fazer panfletos - não se preocupe, eu já consegui que um punhado dos colegas da minha irmã na quinta série concordasse em distribuir para nos na hora do almoço - quero me certificar de que eles pelo menos digam alguma coisa boa. Então. O que eles devem dizer?
Fiquei ali sentada feito um trambolho, com a cabeça totalmente cheia de apenas uma coisa: Jesse.
- Estou dizendo - disse Adam, destampando um pincel atômico e dando uma longa cheirada na ponta. - Nosso slogan deveria ser Vote em Suze: Ela não dá. mole.
- Kelly iria adorar - disse Cee Cee com desdém. - A gente ia ganhar um processo por difamação na hora, por dar a entender que Kelly da mole. O pai dela é advogado, você sabe.
Adam, terminando de cheirar o pincel, falou: - Que tal Suze Manda?
- Isso não rima - observou Cee Cee. - Além disso, a implicação é que o diretório estudantil é uma ditadura, coisa que obviamente não é.
Arrisquei um olhar para Jesse, só para ver como estava reagindo a tudo isso. Mas ele não parecia estar prestando muita atenção. Estava olhando as rosas de Paul.
Meu Deus, pensei. Quando eu voltar a escola, vou matar aquele cara.
- Que tal "Quem sabe vota em Suze"? - falei, esperando apressar Cee Cee e Adam para ter alguma privacidade com meu futuro namorado de novo.
Ajoelhada perto do papelão, Cee Cee inclinou a cabeça para mim, e o sol entrando pelas janelas viradas para o oeste fizeram seu cabelo branco-louro parecer de um amarelo brilhante.
- Quem sabe vota em Suze - repetiu ela devagar. - É. Eu gosto disso. Muito bem, garota.
E em seguida se curvou para começar a escrever o slogan nos pedaços de papelão espalhados no piso do meu quarto. Estava claro que nem ela nem Adam iriam sair tão cedo.
Olhei de novo na direção de Jesse, esperando sinalizar, o mais sutilmente que pudesse, para dizer como lamentava a interrupção.
Mas vi que, para minha perplexidade, Jesse tinha desaparecido.
Não era o máximo, esse cara? Puxa, a gente finalmente o põe numa posição em que parece estar pronto para fazer a grande confissão - fosse ela qual fosse - e então bam. Ele desaparece na cara da gente.
É ainda pior quando o sujeito por acaso esta morto. Porque eu nem podia mandar rastrear a placa do seu carro nem nada.
Não que eu o culpasse por ir embora, acho. Quero dizer, provavelmente eu não ia querer ficar num quarto - que agora cheirava distintamente a pincel atômico - com umas pessoas que não me viam.
Mesmo assim não pude deixar de me perguntar para onde ele tinha ido. Esperava que fosse para ir atrás de Neil Jankowe me impedir de ter mais um fantasma - Craig, o irmão de Neil - com quem lidar. E quando ele voltasse...
Só quando olhei as rosas de Paul de novo me ocorreu a parte real mente horrível daquilo tudo. E não era a questão de quando Jesse voltaria. Na verdade era se. Porque, claro, se você pensasse bem, por que o cara voltaria?
Falei a Cee Cee e Adam que eu não estava chorando.
Disse que meus olhos estavam lacrimejando por causa de tanto pincel atômico. E eles pareceram acreditar.
Uma pena que a única pessoa que eu não parecia capaz de enganar era eu mesma.

Nenhum comentário:

Postar um comentário