Eu me virei arduamente e espiei o relógio iluminado na mesa de cabeceira. Ainda não
estava amanhecendo, mas o amanhecer viria logo. Bill já estava em seu caixão: a tampa
estava fechada. Por que é que eu estava acordada? Eu pensei sobre isso.
Havia algo que eu tinha de fazer. Parte de mim ficou para trás espantada com a minha
própria estupidez enquanto eu colocava um short e uma camiseta e deslizava meus pés em
sandálias. Eu parecia ainda pior no espelho, para o qual eu dei apenas uma olhada de lado.
Eu fiquei de costas para ele para escovar meus cabelos. Para meu espanto e contentamento,
a minha bolsa estava em cima da mesa da sala. Alguém a tinha recuperado lá na sede da
Sociedade na noite anterior. Eu enfiei a minha chave de plástico nela e segui dolorosamente
pelo corredor silencioso.
Barry não estava mais a serviço, e seu substituto era muito bem treinado para me perguntar
o que diabos eu estava fazendo andando por aí parecendo que tinha sido arrastada por um
trem. Ele me arranjou um táxi e eu disse ao motorista onde eu precisava ir. O motorista me
olhou no espelho retrovisor. "Não seria melhor você ir a um hospital?" ele sugeriu
apreensivamente.
"Não. Eu já estive em um." Isso dificilmente pareceu reassegurá-lo.
"Aqueles vampiros tratam você tão mal, por que você anda entre eles?"
"Pessoas fizeram isso comigo," eu disse. "Não vampiros."
Nós saímos. O tráfego estava tranquilo, já que estava quase amanhecendo o domingo.
Levou apenas quinze minutos para chegar ao mesmo lugar que eu tinha estado na noite
anterior, o estacionamento da Sociedade.
"Você pode esperar por mim?" Perguntei ao motorista. Ele era um homem em seus sessenta
anos, grisalho e com um dente da frente faltando. Ele usava uma camisa xadrez com
encaixes ao invés de botões.
"Acredito que eu posso fazer isso," disse ele. Ele puxou uma ficção de velho oeste de Louis
L'Amour de debaixo de seu assento e ligou a luz para ler.
Sob o brilho intenso das lâmpadas de sódio, o estacionamento não mostrava traços
visíveis dos acontecimentos da noite anterior. Havia apenas um par de veículos restante, e
eu percebi que tinham sido abandonados na noite anterior. Um desses carros era
provavelmente de Gabe. Me perguntei se Gabe tinha tido uma família; tomara que não. Por
um lado, ele era tão sádico que devia ter infernizado a vida deles, e por outro, pelo resto de
suas vidas eles irão ficar imaginando como e por que ele morreu. O que Steve e Sarah
Newlin fariam agora? Haveria restado membros suficientes para eles continuarem com a
Sociedade? Provavelmente as armas e as provisões ainda estavam na igreja. Talvez eles
tivessem armazenando contra o apocalipse.
Das sombras escuras próximas à igreja uma figura surgiu. Godfrey. Ele ainda estava
com o peito nu, e ele ainda parecia um adolescente de dezesseis anos. Apenas as
caracteríticas diferentes nas tatuagens e seus olhos desmentiam o seu corpo.
"Eu vim para assistir," eu disse, quando ele estava perto de mim, mas talvez "testemunhar"
teria sido mais exato.
"Por quê?"
"Eu devo isso a você."
"Eu sou uma criatura do mal."
"Sim, você é." Simplesmente não havia como contornar isso. "Mas você fez uma coisa boa,
salvando-me de Gabe."
"Matando mais um homem? Minha consciência mal sabia a diferença. Houveram tantos.
Pelo menos eu poupei você de uma humilhação."
Sua voz arrebatou meu coração. A crescente luz no céu ainda estava tão fraca que as luzes
de segurança do estacionamento permaneceram ligadas, e pelo seu brilho eu examinei o
jovem, jovem rosto.
De repente, absurdamente, eu comecei a chorar.
"Isso é bom," disse Godfrey. Sua voz já estava distante. "Alguém chorar por mim no final.
Eu dificilmente esperaria por isso." Ele se afastou para uma distância segura.
E então o Sol nasceu.
***
Quando eu voltei para o taxi, o motorista guardou o seu livro.
"Tem um incêndio acontecendo ali?" ele perguntou. "Eu pensei que tinha visto uma
fumaça. Eu quase fui ver o que estava acontecendo."
"Está extinto agora," eu disse.
***
Eu esfreguei meu rosto por um quilômetro ou mais, e então eu olhei para fora da janela
enquanto os trechos da cidade emergiam da noite.
De volta ao hotel, entrei em nosso quarto de novo. Eu tirei o meu short, deixei em cima da
cama, e justo quando eu estava me preparando para um longo período de insônia, caí num
sono profundo.
Bill me acordou no pôr do sol, do seu jeito favorito. A minha camiseta foi puxada para
cima, e seu cabelo escuro roçava no meu peito. Era como despertar no meio do caminho,
por assim dizer; sua boca sugava tão carinhosamente metade do que ele me disse que era o
mais belo par de seios do mundo. Ele era muito cuidadoso com suas presas, que estavam
totalmente para fora. Isso era apenas uma das evidências de sua excitação. "Você está afim
de fazer isso, desfrutar isso, se eu for muito, muito cuidadoso?" ele sussurrou no meu
ouvido.
"Se você me tratar como se eu fosse feita de vidro," Eu murmurei, sabendo que ele poderia.
"Mas isso não se parece com vidro," disse ele, suas mãos movendo suavemente. "Isso é
quente. E molhado."
Eu arfei.
"Tanto assim? Estou machucando você?" Sua mão moveu mais vigorosamente.
"Bill" foi tudo que eu pude dizer. Eu coloquei meus lábios nos dele, e sua língua começou
num ritmo familiar.
"Deite-se de lado," ele sussurrou. "Eu vou cuidar de tudo."
E ele cuidou.
"Por que você estava parcialmente vestida?" ele perguntou, mais tarde. Ele se levantou para
pegar uma garrafa de sangue do frigobar no quarto, e foi aquecê-la no microondas. Ele não
tinha tomado nem um pouco do meu sangue, em consideração ao meu estado debilitado.
"Eu fui ver Godfrey morrer."
Seus olhos arderam em mim. "O quê?"
"Godfrey encontrou o amanhecer." A frase que uma vez eu tinha considerado
embaraçosamente melodramática fluiu naturalmente da minha boca.
Houve um longo silêncio.
"Como você sabia que ele iria? Como você sabia onde?"
Eu dei de ombros do jeito que era possível quando se está deitado em uma cama. "Eu só
imaginei que ele ia continuar firme com o seu plano original. Ele parecia bem determinado
sobre ele. E ele salvou a minha vida. Era o mínimo que eu podia fazer."
"Ele demonstrou coragem?"
Olhei nos olhos de Bill. "Ele morreu muito corajosamente. Ele estava ansioso para ir."
Eu não tinha idéia do que Bill estava pensando. "Temos que ir ver o Stan," disse ele.
"Vamos dizer a ele."
"Por que é que temos que ir ver Stan novamente?" Se eu não fosse uma mulher tão madura,
eu faria beicinho. Por assim dizer, Bill deu-me um daqueles olhares.
"Você tem que dizer a ele a sua parte, para que ele se convença de que nós realizamos o
nosso serviço. Além disso, tem a questão de Hugo."
Isso foi suficiente para me deixar desanimada. Eu estava tão dolorida que a ideia de
qualquer roupa a mais do que o necessário tocando a minha pele me fez sentir doente, então
eu puxei um longo vestido sem mangas marrom-acinzentado feito de uma malha suave e
deslizei cuidadosamente meus pés em sandálias, e este era o meu traje. Bill escovou meus
cabelos e colocou meus brincos para mim, uma vez que levantar meus braços era
desconfortável, e ele decidiu que eu precisava de uma corrente de ouro. Eu parecia como se
estivese indo a uma festa no ambulatório para mulheres espancadas. Bill pediu que fosse
trazido um carro alugado. Quando o carro chegou na garagem subterrânea, eu não tinha
idéia. Eu nem sequer sabia quem tinha providenciado isso. Bill dirigiu. Eu não olhei mais
para fora da janela. Eu estava de saco cheio de Dallas.
Quando chegamos à casa em Green Valley Road parecia tão calma quanto há duas noites.
Mas antes que fomos admitidos, descobri que estava movimentada com vampiros. Nós
chegamos no meio de uma festa de boas-vindas para Farrell, que estava na sala com seus
braços em volta de um belo rapaz que poderia ter no máximo dezoito. Farrell tinha uma
garrafa de TrueBlood O negativo em uma mão, e seu acompanhante tinha uma Coca-cola.
O vampiro parecia quase tão rosado quanto o garoto.
Farrell na verdade nunca tinha me visto, então ele estava satisfeito por me conhecer. Ele
estava vestido da cabeça aos pés como um cowboy tradicional do velho oeste, e enquanto
ele se inclinava sobre minha mão, eu esperava ouvir as esporas tinindo.
"Você é tão encantadora," disse ele extravagantemente, agitando o frasco de sangue
sintético, "que se eu dormisse com mulheres, você receberia a minha inteira atenção por
uma semana. Eu sei que você está constrangida com suas contusões, mas elas só realçam
sua beleza."
Eu não pude evitar rir. Não só eu estava caminhando como se tivesse oitenta anos, como o
meu rosto estava preto-e-azul do lado esquerdo.
"Bill Compton, você é um vampiro de sorte," Farrell disse a Bill.
"Estou bem ciente disso," disse Bill, sorrindo, apesar de um pouco friamente.
"Ela é corajosa e bela!"
"Obrigado, Farrell. Onde está o Stan?" Decidi quebrar este fluxo de elogios. Não apenas
isso deixava Bill tenso, mas o jovem companheiro de Farrell estava ficando totalmente
curioso. Minha intenção era relatar essa história mais uma vez, e apenas uma vez.
"Ele está na sala de jantar," disse o jovem vampiro, aquele que trouxe a pobre Bethany para
a sala de jantar quando tínhamos vindo aqui antes. Este devia ser Joseph Velasquez. Ele
tinha talvez um metro e setenta, e sua ascendência hispânica deu a ele um tom de pele
bronzeado e olhos escuros de um fidalgo, enquanto a sua condição de vampiro deu-lhe um
olhar sem emoção e a iminente disposição para causar danos. Ele estava explorando a sala,
à espera de encrenca. Eu decidi que ele era o tipo de sargento do exército do ninho. "Ele vai
ficar feliz em ver vocês dois."
Eu lancei um olhar em torno de todos os vampiros e a pequena quantidade de humanos
nas grandes salas da casa. Eu não vi Eric. Me perguntava se ele tinha voltado para
Shreveport. "Onde está Isabel?" Perguntei a Bill, mantendo a minha voz calma.
"Isabel está sendo punida," disse ele, quase baixo demais para ouvir. Ele não quis falar
sobre isso mais alto, e quando Bill achava que essa era uma idéia sensata, eu sabia que era
melhor calar a boca. "Ela trouxe um traidor ao ninho, e ela tem de pagar um preço por
isso."
"Mas,—"
"Shhh."
Nós fomos para a sala de jantar para encontrá-la tão lotada quanto a sala de estar. Stan
estava na mesma cadeira, usando praticamente a mesma roupa que ele tinha vestido da
última vez que eu o vi. Ele se levantou quando entramos, e da maneira como ele fez isso, eu
entendi que isso era para sinalizar a nossa posição como de pessoas importantes.
"Senhorita Stackhouse," disse ele formalmente, apertando a minha mão com muito cuidado.
"Bill." Stan examinou-me com seus olhos, seu azul desbotado não perdeu um detalhe das
minhas lesões. Seus óculos foram remendados com fita adesiva. Stan era nada menos que
meticuloso com o seu disfarce. Eu pensei em mandar pra ele um protetor de bolsos no
Natal.
"Por favor me diga o que aconteceu com você ontem, não omitindo nada," disse Stan.
Isso me lembrou irresistivelmente de Archie Goodwin se reportando a Nero Wolfe. "Eu
vou entendiar o Bill," eu disse, esperando me livrar desta recitação.
"Bill não se importará de ficar um pouco entediado."
Não havia como contornar isso. Eu suspirei, e começei com Hugo indo me buscar no
Hotel Silent Shore. Tentei deixar o nome de Barry de fora da minha narrativa, já que eu não
sei como ele se sentiria sendo descoberto pelos vampiros de Dallas. Eu simplesmente o
chamei de "um mensageiro do hotel." Claro, eles poderiam saber quem ele era, se
tentassem.
Quando eu cheguei à parte onde Gabe enviou Hugo para a cela de Farrell e em seguida
tentou me estuprar, meus lábios se repuxaram em um sorriso apertado. Meu rosto ficou tão
tenso que eu pensei que poderia rachar.
"Por que ela faz isso?" Stan perguntou a Bill, como se eu não estivesse lá.
"Quando ela está tensa..." Bill disse.
"Ah." Stan olhou para mim ainda mais atenciosamente. Eu estendi o braço e começei a
puxar meu cabelo em um rabo de cavalo. Bill me entregou um prendedor elástico do seu
bolso, e com um desconforto considerável, eu segurei os cabelos em um monte apertado
para que eu pudesse torcer o prendedor em volta dele três vezes.
Quando eu disse a Stan sobre a ajuda que os metamorfos tinham dado a mim, ele inclinouse
para frente. Ele queria saber mais do que eu contei, mas eu não entregaria nenhum nome.
Ele ficou intensamente pensativo depois que contei sobre ser deixada no hotel. Eu não sabia
se devia incluir ou não o Eric; eu o deixei de fora, completamente. Ele supostamente era da
Califórnia. Eu corrigi a minha narrativa dizendo que eu subi para nosso quarto para esperar
pelo Bill.
E então eu disse a ele sobre Godfrey.
Para meu espanto, Stan pareceu que não podia assimilar a morte de Godfrey. Ele me fez repetir a história. Ele girou em sua cadeira para encarar o outro lado enquanto eu falava.
Pelas costas dele, Bill me deu uma carícia reconfortante. Quando Stan virou novamente
para nós, ele estava limpando os olhos com um lenço manchado de vermelho. Então era
verdade que os vampiros podiam chorar. E era verdade que as lágrimas dos vampiros eram
de sangue.
Eu chorei juntamente com ele. Por seus séculos molestando e matando crianças,
Godfrey tinha merecido morrer. Me perguntava quantos humanos estavam na prisão por
crimes que Godfrey teria cometido. Mas Godfrey tinha me ajudado, e Godfrey tinha
carregado com ele a mais tremenda carga de culpa e tristeza que eu já encontrei.
"Quanta determinação e coragem," disse Stan admiradamente. Ele não tinha nenhum pesar,
mas sim ficado absorvido em admiração. "Isso me faz chorar." Ele disse isto de tal maneira
que eu sabia que significava uma grande homenagem. "Depois de Bill identificar Godfrey
na outra noite, fiz algumas perguntas e descobri que ele tinha pertencido a um ninho em
San Francisco. Seus companheiros do ninho sentirão muito ao saberem disso. E de sua
traição a Farrell. Porém sua coragem em manter sua palavra, no cumprimento do seu
plano!" Isso pareceu ter dominado Stan por completo.
Eu apenas sentia dores por todo o corpo. Eu remexi minha bolsa a procura de uma
pequeno vidro de Tylenol, e despejei dois comprimidos em minha mão. Diante do gesto de
Stan, o jovem vampiro me trouxe um copo de água, e eu disse, "Obrigado," para sua
surpresa.
"Obrigado por seus esforços," disse Stan bem abruptamente, como se de repente ele
lembrasse de suas boas maneiras. "Você fez o trabalho para o qual foi contratada, e muito
mais. Graças a você nós descobrimos e libertamos Farrell a tempo, e sinto muito que você
tenha sofrido tantos danos no processo."
Isso soou extremamente como uma dispensa.
"Com licença," eu disse, deslizando para frente na cadeira. Bill fez um repentino
movimento atrás de mim, mas eu o ignorei.
Stan levantou suas claras sobrancelhas diante da minha ousadia. "Sim? O seu cheque
será enviado ao seu representante em Shreveport, conforme nosso acordo. Por favor fique
connosco esta noite enquanto comemoramos o retorno de Farrell."
"O nosso acordo era que se eu descobrisse que um humano fosse culpado, esse humano
não seria punida pelos vampiros mas sim seria entregue à polícia. Para que o sistema
judicial lidasse com ele. Onde está Hugo?"
Os olhos de Stan deslizaram do meu rosto para focar em Bill atrás de mim. Ele parecia estar
silenciosamente perguntando ao Bill porque ele não podia controlar melhor a sua humana.
"Hugo e Isabel estão juntos," disse Stan secretamente.
Eu realmente não queria saber o que isso significava. Mas era uma questão de honra ir
até o fim nisto. "Então você não irá honrar o seu acordo?" Eu disse, sabendo que para Stan
isso era um verdadeiro desafio.
Deveria haver um ditado, ‘orgulhoso como um vampiro’. Todos eles são, e eu apunhalei
Stan em seu orgulho. A implicação de que ele era desonroso enfureceu o vampiro. Eu quase
recuei, seu rosto tornou-se tão assustador. Ele realmente não tinha mais nada de humano
sobrando nele depois de alguns segundos. Seus lábios se afastaram dos seus dentes, suas
presas cresceram, e seu corpo arqueou e pareceu alongado.
Após um momento ele ficou de pé, e com uma breve sacudida de sua mão, indicou que eu
deveria segui-lo. Bill me ajudou, e nós seguimos depois de Stan enquanto ele andava para o
interior de sua casa. Devia ter seis quartos no lugar, e todas as portas para eles foram
fechadas. Por trás de uma porta saíam inconfundíveis sons de sexo. Para meu alívio, nós
passamos por essa porta. Nós subimos as escadas, o que era muito desconfortável para
mim. Stan nunca olhou para trás e nunca diminuiu o passo. Ele subiu as escadas exatamente
no mesmo ritmo em que ele andou. Ele parou em uma porta que parecia igual a todas as
outras. Ele a destrancou. Ele ficou de lado e sinalizou para que eu entrasse.
Isso era algo que eu não queria fazer - oh, tanto. Mas eu tinha que fazer. Eu fui em
frente e olhei dentro.
Exceto pelo azul escuro de parede a parede, o quarto estava vazio. Isabel estava
acorrentada à parede em um lado da sala - com prata, é claro. Hugo estava no outro. Ele foi
acorrentado, também. Ambos estavam acordados, e ambos olharam para a porta,
naturalmente.
Isabel acenou com a cabeça como se tivéssemos nos encontrado no shopping, embora
ela estivesse nua. Vi que seus pulsos e tornozelos foram acolchoados para prevenir que a
prata a queimasse, mesmo assim as correntes continuariam a mantê-la fraca.
Hugo estava nu, também. Ele não conseguia tirar seus olhos de Isabel. Ele mal olhou
em minha direção para ver quem eu era antes de seu olhar retornar para ela. Tentei não ficar
constrangida, porque isso parecia uma consideração bem insignificante; mas eu acho que
foi a primeira vez que eu vi um outro adulto nu na minha vida, além de Bill.
Stan disse, "Ela não pode se alimentar dele, embora ela esteja faminta. Ele não pode fazer
sexo com ela, embora ele esteja viciado. Este é o seu castigo, por meses. O que aconteceria
com Hugo em tribunais humanos?"
Eu ponderei. O que Hugo tinha feito realmente era de fato acusável?
Ele enganou os vampiros por ter ficado no ninho de Dallas sob falsos pretextos. Isto é, ele
realmente amava Isabel, mas ele traiu os companheiros dela. Hmmm. Nenhuma lei sobre
isso.
"Ele colocou escutas na sala de jantar," eu disse. Isso era ilegal. Pelo menos, eu achava que
era.
"Quanto tempo ele ficaria na prisão por isso?" Stan perguntou.
Boa pergunta. Não muito, era o meu palpite. Um júri humano poderia achar que plantar
uma escuta na moradia de um vampiro era até justificável. Eu suspirei, resposta suficiente
para Stan.
"Que outra pena Hugo cumpriria?" ele perguntou.
"Ele me levou para a Sociedade sob falsos pretextos... não é ilegal. Ele... bem, ele..."
"Exatamente."
O olhar ensandecido de Hugo nunca mudou da direção de Isabel.
Hugo tinha causado e auxiliado o mal, tão seguramente quanto Godfrey tinha cometido o
mal.
"Quanto tempo você vai mantê-los lá?" Perguntei.
Stan deu de ombros. "Três ou quatro meses. Iremos alimentar Hugo, é claro. Não Isabel."
"E depois?"
"Vamos libertár-lo primeiro. Ele terá um dia de vantagem."
Bill segurou forte o meu pulso. Ele não queria que eu fizesse mais alguma pergunta.
Isabel olhou para mim e assentiu. Isto parecia justo para ela, era o que estava dizendo.
"Tudo bem," eu disse, segurando minhas mãos em frente em posição de "Pare". "Tudo
bem." E eu me virei e segui meu caminho lenta e cuidadosamente descendo as escadas.
Eu tinha perdido alguma integridade, mas se minha vida dependesse disso, eu não seria
capaz de descobrir o que eu poderia fazer diferente. Quanto mais eu tentava pensar nisso,
mais confusa eu ficava. Não estou acostumada a considerar cuidadosamente questões
morais. É uma coisa ruim a se fazer, ou não é.
Bem, havia um dilema ético aí. É onde alguns conceitos são derrubados, como dormir com
Bill embora não fôssemos casados, ou dizer a Arlene que seu vestido era bonito, quando na
verdade ele fazia ela ficar horrorosa. Na verdade, eu não podia casar com o Bill. Não era
legal. Mas também, ele não me pediu.
Meus pensamentos vagavam num círculo de incerteza em torno do casal miserável do
quarto acima. Para minha surpresa, eu senti muito mais por Isabel do que por Hugo. Hugo,
afinal, era culpado de um mal efetivo. Isabel era apenas culpada de negligência.
Eu tinha muito tempo para divagar mais e mais através de semelhantes padrões de
pensamentos sem saída, uma vez que Bill estava se divertindo entusiasmadamente na festa.
Eu só fui a uma festa mista de vampiros e humanos uma ou duas vezes antes, e era uma
mistura que ainda era desconfortável após dois anos de vampirismo legalmente
reconhecido. Bebendo à vontade – isto é, sugando sangue – de humanos era absolutamente
ilegal, e eu estou aqui para dizer que na sede dos vampiros de Dallas, esta lei foi
rigorosamente vigiada. De tempos em tempos, via um casal desaparecer por um tempo no
andar de cima, mas todos os humanos pareciam voltar em boas condições de saúde. Eu sei,
porque eu contei e observei.
Bill tinha se integrado à sociedade por tantos meses que aparentemente era um verdadeiro
prazer para ele se reunir com outros vampiros. Então ele mergulhou em conversas com este
ou aquele vampiro, relembrando os velhos tempos de Chicago nos anos vinte ou
oportunidades de investimento em diversas propriedades vampíricas em todo o mundo. Eu
estava tão abalada fisicamente que eu estava satisfeita em sentar num sofá macio e assistir,
tomando um gole de vez em quando do meu Screwdriver*. O barman era um rapaz
agradável, e nós conversamos sobre bares por um tempo. Eu deveria estar desfrutando
minha folga de servir mesas no Merlotte's, mas eu iria de bom grado vestir meu uniforme e
anotar pedidos. Eu não estou acostumada a grandes mudanças na minha rotina.
(*coquetel feito de vodka com suco de laranja)
Então uma mulher talvez um pouco mais nova que eu jogou-se no sofá ao meu lado.
Acabou que ela estava saindo com o vampiro que agia como um sargento do exército,
Joseph Velasquez, que tinha ido a sede da Sociedade com Bill na noite anterior. Seu nome
era Trudi Pfeiffer. Trudi tinha o cabelo espetado com pontas bem vermelhas, um piercing
na língua e nariz, e maquiagem macabra, incluindo um batom preto. Ela me disse
orgulhosamente que cor dele era chamada de Túmulo Podre. Seu jeans era tão baixo que eu
me perguntava como ela se levantava e abaixava com ele. Talvez ela usasse esse cós tão
baixo para mostrar o seu piercing no umbigo. Seu top de tricô estava cortado muito curto. A
roupa que tinha usado na noite em que a bacante me atacou perdeu a cor em comparação.
Então, tinha muito de Trudi para ver.
Quando falei com ela, ela não era tão bizarra quanto sua aparência levava você a acreditar.
Trudi era uma estudante universitária. Eu descobri, por meio de escuta absolutamente
legítima, que ela mesma acreditava estar acenando a bandeira vermelha para o touro, por
namorar Joseph. O touro era seus pais, eu deduzi.
"Eles até prefeririam que eu namorasse alguém negro," ela me disse com orgulho.
Eu tentei parecer apropriadamente impressionada. "Eles realmente detestam o cenário dos
mortos, hein?"
"Oh, eternamente." Ela assentiu várias vezes e acenou suas unhas pretas
extravagantemente. Ela estava bebendo Dos Equis*. "Minha mãe sempre diz: 'Você não
pode namorar alguém vivo?" Nós rimos.
(*cerveja mexicana)
"Então, como estão você e Bill?" Ela meneou suas sobrancelhas para cima e para baixo
para indicar o quão significativa era a pergunta.
"Você quer dizer...?"
"Como ele é na cama? Joseph é inacreditavelmente foda."
Não posso dizer que fiquei surpresa, mas fiquei assustada. Eu remexi a minha mente
durante um minuto. "Fico feliz por você," Eu disse finalmente. Se ela fosse minha grande
amiga Arlene, eu poderia dar uma piscadela e sorrir, mas eu não iria discutir a minha vida
sexual com uma estranha total, e eu realmente não queria saber sobre ela e Joseph.
Trudi cambaleou para buscar outra cerveja, e se manteve conversando com o barman. Eu
fechei os olhos de alívio e cansaço, e senti o sofá se pressionar ao meu lado. Abri meu olhar
para a direita para ver qual novo companheiro eu tinha. Eric. Ah, ótimo.
"Como você está?" ele perguntou.
"Melhor do que eu pareço." Isso não era verdade.
"Você viu Hugo e Isabel?"
"Sim." Eu olhei para as minhas mãos dobradas no meu colo.
"Apropriado, você não acha?"
Pensei que Eric estava tentando me provocar.
"De certa forma, sim," eu disse. "Presumindo que Stan cumpra a sua palavra."
"Você não disse isso para ele, eu espero."Mas Eric parecia estar apenas divertido.
"Não, eu não disse. Não em tantas palavras. Vocês são todos tão orgulhosos."
Ele olhou surpreso. "Sim, eu acho que é verdade."
"Você só veio para me investigar?"
"Para Dallas?"
Eu assenti.
"Sim." Ele deu de ombros. Ele estava vestindo uma camisa de malha numa bonita
padronagem bege-e-azul, e ao se encolher os seus ombros pareceram imensos. "Estamos
emprestando você pela primeira vez. Eu queria ver se as coisas correriam bem, sem estar
aqui na minha capacidade oficial."
"Você acha que Stan sabe quem você é?"
Ele pareceu interessado na idéia. "Não é difícil de acreditar," disse ele finalmente. "Ele
provavelmente teria feito a mesma coisa no meu lugar."
"Você acha que a partir de agora, você poderia só me deixar ficar em casa, e deixar a mim e
Bill em paz?" Perguntei.
"Não. Você é muito útil," disse ele. "Além disso, tenho esperanças de que quanto mais você
me ver, mais gostará de mim."
"Tal como um fungo?"
Ele riu, mas seus olhos estavam fixos em mim de um jeito de quem pretendia seriamente.
Oh, inferno.
"Você fica especialmente saborosa nesse vestido de malha sem nada por baixo," disse Eric.
"Se você deixasse Bill e viesse para mim por sua vontade própria, ele teria que aceitar."
"Mas não vou fazer uma coisa dessas," eu disse, e então algo capturou os limites da minha
consciência.
Eric começou a dizer outra coisa para mim, mas coloquei minha mão na sua boca. Movi
minha cabeça de um lado para o outro, tentando obter a melhor recepção; esta é a melhor
forma que posso explicar isso.
"Me ajude a levantar," eu disse.
Sem uma palavra, Eric se levantou e suavemente puxou-me para ficar de pé. Eu podia
sentir minhas sobrancelhas se juntando.
Eles estavam todos à nossa volta. Eles cercaram a casa.
Seus cérebros estavam ávidos para entrar em campo. Se Trudi não estivesse tagarelando
antes, eu poderia tê-los ouvido enquanto eles moviam-se furtivamente até cercar a casa.
"Eric," eu disse, tentando apanhar tantos pensamentos quanto eu conseguia, ouvindo uma
contagem regressiva, oh, Deus!
"Todos no chão!" Eu gritei com meus pulmões a toda força.
Cada vampiro obedeceu.
Então, quando a Sociedade abriu fogo, foram os humanos que morreram
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