quarta-feira, 6 de julho de 2011

Férias!! - MARIAN KEYES Cap.27


Em pouco tempo, tinha gente saindo pelo ladrão.
Havia uma fila quilométrica para o banheiro, formada pelos que
tinham ido às compras nos Supermercados Wayne e ainda estavam se sentindo
inibidos demais para cheirar cocaína em público. Esse decoro nunca ia além da
primeira carreira.
A música rompera a barreira do som durante minha breve ausência.
Tentei trocar o CD, mas Carlos escondera todos os outros. Brigit não me ajudou
em nada, enquanto eu corria desesperada de um lado para o outro, tentando
descobrir onde ele os pusera. Estava ocupada demais tentando fazer bonito
diante dos quadris rodopiantes de Carlos. Eu temia pela integridade de nossos
poucos enfeites. Depois de uma guinada excepcionalmente violenta, comecei a
me preocupar com os abajures.
Agora, todos os quatro cubanos estavam dançando, com seus pezinhos
ágeis e seus quadris que valiam por três, fazendo olhar de peixe morto para
todas as mulheres presentes. Tive que me virar de costas.
Continuava chegando gente sem parar. Eu não conhecia ninguém, com
exceção de Brigit e dos cubanos. A campainha tocou novamente e outro exército
de gente entrou, na maior animação.
Sua única virtude era o fato de serem homens.
"Aí, mina, firmeza?" Tinham por volta de quatorze anos, usavam
chapéus, tênis, roupas largas, skates e o jargão dos surfistas. Até então, eu me
achava muito descolada. Mas minha euforia murchou rapidamente, surgindo em
seu lugar uma certa sensação de meia-idade. Eles pontuavam as frases com
gestos engraçados — dobravam todos os dedos, menos o mindinho e o polegar —
e diziam "irado" o tempo todo. Seu sotaque vinha do Harlem. Não havia nada de
errado nisso. Salvo pelo fato de que eles vinham de New Jersey. Numa limusine
de vinte metros de comprimento. Cafajestes classe média tentando parecer
descolados. E estavam na minha festa. Isso não era nada bom.
— Oi, Rachel — disse uma voz. Quase caí no chão, numa pose do
gênero "quem sou eu". Era Helenka. Eu sentia a mais profunda admiração por
Helenka. Considerava-a minha amiga, mas era puro otimismo da minha parte.
Embora ambas fôssemos irlandesas, sua vida em Nova York fora muito
mais bem-sucedida do que a minha. Ela era linda, tinha roupas fantásticas,
conhecia Bono e Sinéad 0'Connor, fazia RP para a Junta Comercial Irlandesa, já
estivera no iate dos Kennedys e nunca falava bem de ninguém. Eu estava
honrada por ela ter vindo à minha festa, sua presença punha nela o selo do
sucesso.
E o fato de estar usando a capa de chiffon comprida até os pés que
aparecia na capa da Vogue daquele mês só contribuía para aumentar meu bemestar
geral.
— Então é este o seu apartamentinho? — perguntou.
— Meu e de Brigit — respondi, gentil.
— Vivem duas pessoas aqui? — Ela pareceu atônita.
Não me importei. Sentia-me maravilhosamente bem, e nada poderia me
aborrecer.
— Que história é essa que ouvi de você estar namorando um daqueles
garotos metaleiros? — perguntou Helenka.
— Eu? Namorando um deles? — Soltei uma gargalhada forçada.
— É, Jessica disse que viu você no Rickshaw Rooms praticamente
fazendo sexo com ele.
Jessica era o braço direito de Helenka. Não era tão bem-apessoada,
bem-vestida, bem remunerada ou bem relacionada quanto Helenka. O único
departamento em que ninguém a destronava era o da difamação.
Quase morri de vergonha, tentando imaginar o que ela dissera.
— Ela, hum, viu, é? — foi só o que me ocorreu dizer.
— Sempre achei que um daqueles garotos tinha um tesão meio
selvagem, animal — disse ela, pensativa. — Sabe como? — Volveu-me seu olhar
de esmeralda. Ela só está usando lentes de contato, disse a mim mesma,
tentando parar de tremer de reverência por sua beleza.
— Luke — disse, por fim.
— É esse. Faz um tipão.
— Para ser franca — disse eu, não cabendo em mim de orgulho —, era
Luke que eu estava beijando.
— Ou talvez seja Shake — tornou, distraída. — Seja como for, comigo a
coisa nunca sairia do papel.
Cravou em mim um olhar ferino e se afastou. Pelo visto, meu projeto
de ficar amiga de Helenka não fizera muito progresso.
Eu estava ao lado da porta quando, de repente, tive a impressão de
estar imaginando coisas, ao ver surgir na soleira uma patarra pesada calçando
uma bota. Seguida por outras nove patarras.
Cinco gigantes marcharam na minha direção, cabeludos, vestindo
jeans da cabeça aos pés, todos engalanados e carregados de kits de cervejas. Os
Homens-de-Verdade tinham chegado.
Quem os convidara? Como ficaram sabendo? Eu estava frita.
Paralisada de pânico, durante uma fração de segundo tive o instinto de
bater a porta, negando ter qualquer conhecimento de que houvesse uma festa,
mas o olhar de Joey já tinha cruzado com o meu.
— Abre as pernas, yeh, garota, yeh! — cumprimentou-me.
Que diabo, pensei. Sentia-me invencível. Forte, deslumbrante, segura
de mim. Pronta para topar qualquer parada. Com o rabo do olho, vi o rosto
apavorado de Brigit pular de Joey para Carlos e de novo para Joey. Parecia estar
tentando não gritar.
Cumprimentei educadamente os rapazes, sob o olhar de Madrasta
Malvada de Helenka. Corei, mas mantive a cabeça erguida. Não estava com
medo.
Luke foi o último a entrar.
— Oi. — Abriu um sorriso. — Como vai?
Meu Deus, pensei, as entranhas pegando fogo na hora, como ele está
bonito.
— Oi — saudei-o com uma voz rouca e sensual, sustentando seu olhar
durante tanto tempo, que pareceu um dia e meio. Será que ele fizera alguma
coisa?, pensei, pasma. Porque, sem dúvida, nunca fora tão bonito assim, fora?
Um transplante de cabeça, talvez? Quem sabe não convencera Gabriel Byrne a
lhe emprestar o rosto por uma noite?
Notei que tinha me empertigado, projetando o peito em sua direção, ao
estilo das cachorras desabusadas. Só de olhar para ele, meus mamilos ficaram
duros.
— Desculpe por não ter querido sair com você — disse, petulante.
Nunca tocaria no assunto, se não tivesse cheirado duas carreiras. Mas
tinha cheirado, e me sentia cheia de compaixão e generosidade.
— Está tudo bem. — Ele pareceu achar graça.
— Não está, não — insisti.
— Está, sim. — Ele pareceu achar mais graça ainda.
— Quer conversar sobre isso? — perguntei, entre terna e ansiosa. Ele
ficou em silêncio por um momento. Por fim, riu.
— Que foi? — Minha invencibilidade balançou um pouco.
— Rachel — disse ele —, achei você uma pessoa muito legal. Teria
gostado de te ver de novo. Você não quis. Fim de papo.
— Foi só isso que você achou de mim? — perguntei, emburrada. Ele
deu de ombros, parecendo desconcertado.
— Que é que você quer que eu diga?
— Bom, você não se sentiu atraído por mim?
— É claro que me senti atraído por você — sorriu. — Quem não se
sentiria? — Era mais o que eu queria ouvir.
— É isso — prosseguiu. — Achei você linda. E muito legal. Mas respeito
sua decisão. Agora, vou deixar você e dar uma volta por aí.
— Achou? — Segurei-o pelas costas da jaqueta, fazendo beicinho. Ele
se voltou, surpreso.
— Achou? — repeti. — Você me achou linda. Pretérito perfeito? Ele deu
de ombros, como se estivesse confuso.
— Rachel, você não quis sair comigo. Por que está me perguntando
isso?
Em silêncio, me aproximei dele e, enquanto me fitava, surpreso, enfiei
o indicador no cós de sua calça jeans. Sustentando seu olhar sobressaltado,
puxei-o para mim num só gesto fluido.
Quase gargalhei de prazer. Sentia-me extremamente poderosa pela
audácia incomum de meu comportamento — eu era uma mulher em contato
com a sua sensualidade, que sabia o que queria e como conseguir. Seu peito
encostava no meu, suas coxas encostavam nas minhas, eu sentia seu hálito em
meu rosto inclinado para o seu. Enquanto esperava que ele me beijasse, já ia
planejando como tirar todo mundo do meu quarto. A porta não tinha chave, mas
eu poria uma cadeira debaixo da maçaneta. E não era incrível que tivesse
depilado as pernas justamente na véspera?
A centelha entre mim e Luke era inegável. Não era a primeira vez que
eu lamentava o fato de ele ser tão brega. Mas, talvez, se cortasse o cabelo,
comprasse roupas novas e...
Estou pronta para o beijo, Luke.
Prontinha.
Mas ele não me beijou.
E eu lá esperando, impaciente. A coisa não estava saindo exatamente
conforme o planejado, que é que estava havendo com ele?
— Meu Deus. — Ele sacudiu a cabeça e, com um empurrão curto,
desvencilhou-se de mim. Aonde ele ia? Estava louco por mim e eu estava muito
atraente, muito sensual. Então, que negócio era esse?
— Sua arrogância — disse ele, com um risinho.
Não compreendi. Eu estava agindo com desassombro e autoconfiança.
Era uma mulher tomando a iniciativa, como as revistas sempre me mandavam
fazer. Não conseguia entender por que o tiro saíra pela culatra de maneira tão
inesperada.
— Diz aí, Rachel, que é que você andou cheirando mais cedo? — ele
perguntou, em tom confidencial.
E o que isso tinha a ver?, me perguntei.
— Já entendi — disse ele. — Bom, me procura de novo, quando seu ego
voltar à Terra.
E se afastou!
Minha autoconfiança foi abalada. Como se por um momento as luzes
diminuíssem de intensidade e a festa deixasse de ser um evento social
deslumbrante, para se tornar apenas uma barafunda de bêbados num
apartamento de dimensões inverossímeis em Nova York, com três balões presos
à porta por um pedaço de durex.
Então, endireitei os ombros. Já estava mais do que na hora de cheirar
outra carreira. Havia um amplo leque de homens atraentes na minha sala. Havia
até mesmo uma chance de que alguns deles não fossem gays.
Luke Costello que fosse à merda!

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