sexta-feira, 1 de julho de 2011

MELANCIA - MARIAN KEYES Prefácio


Quinze de fevereiro é um dia muito especial para mim. É o dia em que dei à luz
meu primeiro filho. E também o dia em que meu marido me deixou. Como ele esteve
presente ao parto, só posso supor que os dois acontecimentos tiveram alguma
relação entre si.
Eu sabia que deveria ter seguido meus instintos.
Era a favor do papel clássico, ou, digamos, tradicional, que o pai desempenha
no nascimento dos seus filhos. Que é o seguinte: tranque-o num corredor do lado de
fora da sala de parto. Não deixe que entre, em momento algum. Dê-lhe quarenta
cigarros e um isqueiro. Instrua-o a caminhar até o fim do corredor. Quando chegar a
essa feliz posição, instrua-o a dar a volta e retornar ao local de onde veio.
Repita, se necessário.
A conversa deve ser reduzida. Tem permissão para trocar algumas palavras
com qualquer outro pai em perspectiva caminhando ao seu lado.
"Meu primeiro" (sorriso amarelo).
"Parabéns... meu terceiro" (sorriso pesaroso).
"Mandou brasa" (sorriso forçado - ele está tentando sugerir que é mais viril do
que eu).
A essa altura, os sentimentos tendem a se exacerbar.
Ou eles têm permissão para se jogar em cima de qualquer médico que saia
exausto da sala de parto, coberto de sangue até os cotovelos, e arquejar: "Alguma
notícia, doutor???" Ao que o médico poderá responder: "Ah, meu Deus, não, cara!
Está com uma dilatação de apenas três centímetros". E seu marido fará um sinal
afirmativo com a cabeça, como se entendesse tudo, embora não entenda nada além
do fato de que ainda há um bocado de vaivens pela frente.
Ele também tem permissão para deixar um espasmo de angústia passar por
seu rosto, ao ouvir as agonias de sua amada lá dentro. E quando tudo termina, mãe
e filho estão limpos: a mãe, com uma camisola imaculada, está recostada em
travesseiros rendados, com um ar exausto, mas feliz, e o bebê perfeito está
mamando; então, e apenas então o pai deve ter permissão para entrar.
Mas não, cedi à pressão das colegas e concordei em agir de uma maneira
inteiramente New Age a respeito do assunto. Só posso dizer que as dúvidas foram
muitas. Quero dizer que não desejava nenhuma de minhas amigas íntimas e nem
parentes na remoção do... digamos... meu apêndice. Humilhante! A pessoa fica
numa situação de tamanha desvantagem. Todas aquelas pessoas olhando-a,
reparando em lugares que você mesma nunca viu, nem sequer com um espelho. Eu
não sabia como era o aspecto do meu intestino grosso. E, como prova do que digo,
não sabia como era o aspecto do colo do meu útero. Nem queria saber. Mas metade
do pessoal do Hospital St. Michael sim.
Senti-me em grande desvantagem. Assim, não estava fazendo justiça a mim
mesma.
Em poucas palavras, eu não estava com a minha melhor aparência. Como
digo, uma coisa bastante humilhante.
Eu vira na televisão, uma porção de motoristas de caminhão, machistas, que
mal sabiam se expressar, com lágrimas nos olhos, a voz embargada, esforçando-se
para nos dizer que estar presente no nascimento do seu filho fora a coisa mais pr...
pro... prof.. funda que já acontecera com eles! E ouvira histórias sobre atléticos
jogadores de futebol americano, entornadores de cerveja, que convidaram a equipe
inteira para fazer uma visita e assistir ao vídeo da mulher deles parindo.
Mas, novamente, a gente fica imaginando seus motivos.
De qualquer jeito, James e eu ficamos muito emocionados com relação ao
parto e decidimos que ele deveria estar presente.
E esta é a história de como ele estava lá, na sala de parto. A história do motivo
pelo qual ele me abandonou, e como o fez... é um pouquinho mais longa.

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