quarta-feira, 6 de julho de 2011

Férias!! - MARIAN KEYES Cap.64

Eu sabia que seria errado para nós dois, e tinha a forte suspeita de que
ele sequer se sentia atraído por mim. Mas estava determinada a ir até o fim, de
um jeito ou de outro.
Não devia.
Foi uma dessas sessões de sexo que parecem um pesadelo, quando
vocês dois compreendem, três segundos depois de dada a largada, que tudo não
passa de um engano terrível, terrível.
E, nessas circunstâncias, com setenta e dois quilos de carne
masculina grunhindo e prendendo você ao colchão, como inventar uma desculpa
e ir embora?
Não dá para fingir que acabou de avistar um conhecido do outro lado
do quarto.
Ah, não.
Também não pode olhar para o relógio de pulso, soltar um "Ih!" e
mastigar uma desculpa incoerente sobre o fato de a amiga com quem mora não
ter cópia da chave de casa.
Nem pensar.
Você tem que ficar lá até o final dos tempos, limitando-se a sorrir e
agüentar.
Assim que tiramos nossas roupas, o que foi por si só um suplício, senti
toda a paixão se esvair no ato. Eu sabia, apenas sabia que ele tinha perdido
totalmente a atração por mim. Quase podia farejar o seu pânico.
E eu também perdera totalmente a atração por ele. Ele era uma
decepção dos pés à cabeça. Pequeno demais. A despeito do que eu estava
sentindo por Luke, não podia negar que seu corpo era lindo. Em comparação,
Chris deixava a desejar em todos os departamentos. Todos mesmo.
Éramos bem-educados demais para interromper a evolução dos fatos.
Era como aparecer na casa de uma amiga depois de um lauto jantar e
descobrir que ela preparou outro para você, sofisticadíssimo, de oito pratos. Que
você tem que comer, mesmo sentindo vontade de vomitar a cada garfada.
Angustiada, assisti ao ritual de colocação do preservativo. Quando você
não está minimamente delirante de paixão, um marmanjo cobrindo o trabuco
com um pedaço de plástico parece uma rematada loucura. Ato contínuo, nos
entregamos, a contragosto, a uma curta sessão de preliminares. Degustação de
mamilos, esse tipo de coisa, sem o menor entusiasmo. Em seguida, ele montou
em mim para o grande acontecimento.
Que sensação de estranheza horrível, horrível, a de ser penetrada por
um pênis que não tinha Luke atarraxado na outra ponta. Mas, pelo menos, a
coisa estava andando, e logo acabaria.
Errado.
Durou uma eternidade.
Será que ele não vai gozar nunca, pelo amor de Deus, implorei ao
universo, enquanto ele fazia o seu bate-estaca em cima de mim. Naturalmente,
não havia a menor chance de eu vir a gozar, mas fingia uma vez atrás da outra,
na esperança de que, se ele estivesse esperando por mim, finalmente se
apressasse e concluísse as negociações.
Mas ele lá, bimba, bimba, bimba, até eu começar a sentir dor.
Provavelmente, iria para casa cheia de bolhas.
Me ocorreu, então, que talvez ele fosse um desses homens que acham
que não satisfizeram a mulher até ela gozar várias vezes. Assim sendo, fingi mais
alguns orgasmos, para apressá-lo.
Mas ele continuou lá, bimba, bimba, bimba.
E só parou muito, muito tempo depois...
Não com um gemido profundo, alguns espasmos agônicos e uma
expressão de quem acabou de levar um chute a gol nos colhões. E sim
desacelerando aos poucos, o pinto com uma consistência de marshmallow, o que
nada mais era do que um atestado do seu fracasso.
— Desculpe, Rachel — murmurou ele, sem olhar para mim.
— Tudo bem — retruquei, em voz baixa, também sem olhar para ele.
Por mim, teria ido embora, mas não queria pedir carona a ele e, de
mais a mais, de que adiantaria, tendo seu carro sido roubado? E meu dinheiro
não dava para um táxi.
Ele mesmo retirou o preservativo, jogou-o na cesta de lixo — ugh —,
apagou a luz e deitou-se de costas para mim. Eu não esperava outra coisa.
Luke e eu sempre dormíamos aninhados nos braços um do outro,
relembrei, cheia de tristeza.
Aquele filho-da-mãe.
Deitada no escuro, de repente me bateu uma puta fome. Devia ter
comido o feijão frito.
Agora era tarde demais.
Dormi horrivelmente mal. Um sono leve, cheio de sobressaltos. Quando
acordei, por volta das seis e meia, minha sensação de derrota foi tão intensa que
não agüentei ficar lá nem mais um segundo. Vesti-me, resoluta, apanhei minha
bolsa e me dirigi para a porta.
Então hesitei, ao me dar conta de que não havia absolutamente mais
nada de bom na minha vida. Vasculhei a bolsa até encontrar uma caneta, anotei
o número de meu telefone num pedaço de papel e coloquei-o no travesseiro dele.
Não tive coragem de fazer o truque que fizera com Luke, de amassar o papel
numa bola, atirá-la na cesta de lixo e dizer "Pronto! Isso vai te poupar o
trabalho". Porque, no caso de Chris, seria verdade.
— Eu te ligo — murmurou ele, sonolento.
Claro que não ligou.
Eu podia estar abstinente, mas, de resto, nada tinha mudado na
minha vida.
Eu estava parada no ponto de ônibus, e as pessoas que tinham saído
cedo para trabalhar olhavam minhas roupas cheguei, soltando risadinhas.
Menos o garoto adolescente que me achou com cara de presa fácil,
subiu as escadas do ônibus no meu encalço e sentou atrás de mim,
murmurando "Calcinha, calcinha, vi sua calcinha", num tom de voz tão baixo
que, no começo, achei que fosse minha imaginação. Fiquei com medo de trocar
de assento e as pessoas olharem para mim outra vez.
Quando desci do ônibus, o motorista piscou o olho para mim: "Cê vai
ter que dar algumas satisfações prá sua mamãe." Ignorei-o, ganhando a calçada,
e jurei para mim mesma, Não vou olhar prá cima, não vou olhar prá cima. Mas
me senti impotente, dominada por um instinto poderoso, irresistível. Levantei a
cabeça, e não deu outra: o asqueroso garoto obcecado por calcinhas estava
olhando para mim, com um sorriso safado. Desviei bruscamente meus olhos dos
seus, mas não sem antes deduzir, pelos seus gestos, que pretendia bater uma
excelsa punheta em minha homenagem.
Encetei a curta caminhada para casa, me sentindo imunda.
Mas, pelo menos, alguém sente tesão por mim, me peguei pensando,
quase a meio caminho andado de casa.
Minha mãe me recebeu de um jeito que me fez lembrar no ato a razão
pela qual eu tinha ido embora de casa.
— Pelo amor de Deus, onde é que você estava? — gritou, de camisola e
olhos esgazeados. — Eu já estava quase telefonando para a polícia!
— Passei a noite na casa da Sra. Hutchinson. — Achei que "Sra.
Hutchinson" soaria muito mais conveniente do que "Passei a noite com Chris e
tentamos trepar, mas ele broxou." — Passei a noite na casa da Sra. Hutchinson.
Ia voltar para casa, mas o carro deles foi roubado, e ele teve que ligar para a
companhia de seguros e a polícia, para dar queixa...
Eu falava depressa, esperando distraí-la da raiva que estava sentindo
de mim, com a história do carro roubado.
— Philomena e Ted Hutchinson estão em Tenerife — disse ela, entre os
dentes. — Você ficou lá sozinha com ele.
— Para ser franca, mamãe, fiquei, sim — concordei, com ar jovial. Já
estava cheia disso tudo. Era uma mulher adulta.
Com essa, ela ficou fora de si. Tentou me bater, atirar uma escova em
cima de mim, sentar, levantar e romper em lágrimas, tudo ao mesmo tempo.
— Sua vagabunda! — gritou. — Não tem vergonha na cara? Ele é um
homem casado! E os três filhos dele? Imagino que você não tenha parado para
pensar neles.
O choque que me paralisou deve ter transparecido em minha
expressão, pois ela gritou:
—Você nem sabia, não é? Pois bem, que tipo de idiota você é? Uma
burra imprestável e egoísta que sempre fez tudo errado. — Seu rosto estava
vermelho e ela ofegava. Eu tinha ficado gelada de horror. — Aposto como você
nem sabia que ele foi expulso do Claustro a primeira vez que esteve lá! — gritou.
— Porque foi apanhado tendo relações com uma mulher casada num dos
banheiros. E quer saber o que me deixa mesmo fula da vida?
Respondi que não, mas ela me disse, mesmo assim:
— Já foi bastante ruim o papelão que você me fez passar com aquele
deus-nos-acuda das drogas, e agora tinha que fazer uma coisa dessas. Sempre
foi uma fedelha mimada e egoísta, nunca me esqueci daquela vez em que comeu
o ovo de Páscoa da coitada da Margaret, você faz essas coisas de propósito, só
para me espicaçar...
Saí correndo da sala e subi as escadas, com ela parada ao pé do lance,
gritando comigo:
— Sua fedelha egoísta, só pensa em si. Pois bem, pode ir tratando de ir
embora, e não precisa se dar ao trabalho de voltar. Anda, faz suas malas e sai
daqui, vai ser um alívio para mim se nunca mais tornar a pôr os olhos em você.
Me atormentando desse jeito...
Eu estava trêmula do choque. Sempre odiara discussões, e estava
horrorizada com a força do ódio da minha mãe. Seu desprezo por mim era
aterrador. Eu há muito desconfiava que ela me considerava uma grande
decepção, mas a dor da confirmação foi excruciante.
Para não mencionar o que ela me dissera sobre Chris. Eu mal podia
acreditar. Ele era casado. Com três filhos. Obviamente, era separado da mulher,
mas isso não melhorava as coisas.
Não conseguia parar de pensar na total falta de desejo dele por mim,
que o impedira de gozar. Se o sentimento provocado por sua rejeição já era
horrível, em conjunção com o ódio de minha mãe, foi demais.
Mas eu sabia exatamente o que iria fazer.
Primeiro, trocar de roupa. Em seguida, mendigar, roubar ou pedir um
dinheirão emprestado, ir para a rua, comprar uma porrada de drogas, ingeri-las
e me sentir melhor.
Entrei no meu quarto trocando as pernas e bati a porta, para abafar os
gritos histéricos de mamãe. As cortinas estavam fechadas e havia uma pessoa
na minha cama. Uma não, duas: Helen e Anna.
De novo.
Por que ninguém nessa casa podia dormir na sua própria cama,
porra?, me perguntei, exausta. E por que Helen e Anna estavam juntas? As duas
não se odiavam?
Ambas estavam no oitavo sono, enroscadas como dois gatinhos
graciosos, os longos cabelos negros confundindo-se espalhados sobre os
travesseiros, os cílios pontudos sombreando seus rostinhos serenos.
Acendi a luz, no ato causando um rebuliço.
— Puta que p...! — Uma das duas sentou-se, assustada. — Eu tava
dormindo!
— Apaga essa porra de luz — ordenou a outra.
— Não — disse eu. — Esse quarto é meu e preciso encontrar umas
coisas.
— Mocréia — murmurou Helen, inclinando-se para fora da cama e
pondo-se a revirar sua bolsa.
— Você tá bem? — perguntou Anna, com um tom de voz surpreso.
— Tô ótima — respondi, curta e grossa.
— Toma — disse Helen, entregando a Anna um par de óculos escuros.
— Bota aí, prá gente poder voltar a dormir.
Helen também colocou um par na cara, e ficaram as duas na cama, de
óculos escuros, parecendo os Irmãos Cara-de-Pau.
— E aí? — Helen resolveu puxar conversa. — Trepou com o cara?
— Trepei — respondi, trêmula. Fiz uma pausa. — E não trepei. Helen
alteou uma sobrancelha por trás dos óculos escuros.
— Trepou e não trepou? Boquetes?
Fiz que não com a cabeça, arrependida por ter chegado a dizer alguma
coisa, pois não queria falar no assunto.
— Permita-me lembrar — insistiu Helen — que sexo anal vale como
trepada.
— Obrigada, Helen.
— Foi isso?
— Isso o quê?
— Sexo anal?
— Não.
— Não gosta?
— Não ligo. — Na verdade, nunca experimentara, mas não ia admitir
isso para uma irmã muito mais nova. Era eu quem devia estar falando dessas
coisas com ela, e não o contrário.
— Eu adoro — murmurou ela.

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